quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010


Ontem, divagando aqui pela internet, fui ter a um blog de determinada pessoa que dedicava um post do seu blog à passada greve dos enfermeiros, referindo-se em algumas circunstancias a estes profissionais de saúde de forma menos apropriada. Tipica pessoa que pensa que sabe tudo mas que na realidade nada sabe.
Depois de me dar ao trabalho de ler o dito post cheguei à conclusão que o jovem não faz a minima ideia do que é ser enfermeiro. Lembrei-me portanto de relatar um dos meus dias enquanto enfermeira aqui no meu blog e deixá-lo à disposição de dita pessoa para que se o entender ler fique pelo menos ligeiramente esclarecido.
Sem pensar muito reflicto no dia de hoje...
Chegada ao serviço 7h30, fardei-me e entrei na unidade perto das 8h para receber o turno. Antes ainda tive tempo de olhar para a destribuição de doentes, quando referi as camas que me tinham calhado os meus colegas do turno anterior só me disseram "prepara-te". A doente que tenho vindo a acompanhar estava pior e tinha sido novamente ventilada.
Depois da passagem de turno, olhei para a medicação que tinha de dar e fiz uma selecção daquilo que poderia dar ou não, logicamente que por exemplo um perfalgan E.V a uma doente hipotensa não daria bom resultado.
De seguida dediquei-me à prestação de cuidados de higiene, que segundo alguns é simplesmente "lavar cus", para mim é um momento que mexe não só com a intimidade da pessoa, como também com a sua dignidade e quando se trata destes dois aspectos chega a ser ofensivo colocar esta prática nos termos anteriormente referidos. Basta que cada um pense como um doente, deitado numa cama limitado dependente de um estranho para estar cuidado...mas para alguns imaginar isto é de facto dificil, a arrogância e o sentirem-se donos da palavra cega-os...
De um lado tinha a doente hipotensa, ventilada e em anúria. Do outro lado tinha um doente hipertenso e completamente desorientado. E era eu que estava ali junto deles...
A doente hipotensa, fez dopamina, dobutamina, aumentou as perfusões, parou a dobutamina, inicio noradrenalina, fez furosemida, parou noradrenalina, iniciou novamente dobutamina, fez mais umas quantas formulas de furosemida...fez um ECG, fiz-lhe uma lavagem vesical, colhi sangue, fiz colheita de secreções, auxiliei no rx, voltei a colher sangue, coloquei-lhe uma transfusão sanguinea, fiz-lhe a medicação habitual, vigiei sinais vitais,coloquei uma gelofundina, vigiei débitos urinários, e ainda assim tive tempo de estar com ela dar-lhe a mão que ela agarrava insessantemente não querendo que eu a deixasse ali sozinha.
No meio de tudo isto, ainda tinha o outro doente, com a tensão sempre instavel a precisar permanentemente de vigilância, a retirar acessos, oxigénio a querer levantar-se da cama ligado a uma serie de maquinas...
Depois de tudo isto termino o meu trabalho depois da hora prevista, porque ainda há registos para fazer porque essa não era a prioridade.
Trata-se de um simples resumo de um dia...na realidade as coisas custam bem mais do que estar aqui sentada a escrever estas palavras, lidamos com vidas que estão muitas vezes dependentes dos cuidados que lhes prestamos, mas estas coisas às vezes só são percebidas quando são sentidas na pele. Espero que o tal poeta não precise de tal coisa para ter pelo menos uma breve noção do que é afinal a enfermagem.

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